Até o último momento, a pesquisa feita na Escola de Medicina da Universidade Cornell, em Nova York, parecia um sucesso retumbante. A equipe do neurologista Steven Goldman havia conseguido algo que muitos pesquisadores tinham tentado antes sem sucesso: fazer uma quantidade suficiente de células-tronco embrionárias se transformar em células nervosas produtoras de dopamina para reverter os sintomas de Parkinson.
A doença surge quando os neurônios que produzem essa substância -- uma molécula responsável pelas transmissões entre as células nervosas -- param de funcionar. Até agora, os cientistas que tentaram fazer células-tronco suprirem essa perda não tinham conseguido mais do que 25% de eficiência -- o que não fazia praticamente nada contra os sintomas da doença.
Os pesquisadores de Cornell, no entanto, conseguiram aumentar essa taxa para 80% ao desenvolver uma técnica que “enganava” as células-tronco. “Nossa intenção era fazer as células se comportarem no laboratório, in vitro, da mesma maneira que se comportam no cérebro, in vivo”, explicou Goldman ao G1. Para isso, eles criaram um ambiente muito parecido com o do cérebro, expondo as células-tronco às substâncias secretadas por células cerebrais humanas -- retiradas de fetos abortados.
Com isso, os pesquisadores conseguiram não apenas células nervosas produtoras de dopamina, mas exatamente as células nervosas produtoras de dopamina que queriam, encontradas na área do cérebro responsável pelo controle dos movimentos. “Ao ver esses resultados, fomos ficando cada vez mais confiantes de que conseguiríamos reverter os sintomas de Parkinson em um experimento in vivo. E foi exatamente isso que aconteceu”, diz Goldman.
As células-tronco transformadas em neurônios foram transplantadas para o cérebro de camundongos com Parkinson. “Os resultados foram espetaculares”, conta o neurologista. O controle motor foi recuperado de forma nunca conseguida por qualquer pesquisa anterior.
A festa para comemorar os resultados, no entanto, teve que ser adiada. Três meses após o transplante, a equipe de Goldman matou as cobaias para analisar como estavam seus cérebros. E apesar de terem observado os animais durante todo esse tempo sem encontrar nenhum vestígio de problema do tipo, eles descobriram que, em meio às células transplantadas que se tornaram neurônios, em todos os camundongos, havia uma massa de células-tronco que não havia conseguido se transformar e começava a se dividir perigosamente. Embora o Parkinson estivesse controlado, os animais tinham adquirido um alto risco de desenvolver tumores cerebrais.
“Durante todo o estudo, nós procuramos sinais de teratoma, que é o câncer das células embrionárias. Não encontramos nada. Esses tumores que se formaram não são teratomas. Não podemos sequer chamá-los de cânceres, porque eles não têm as características de um câncer”, diz Goldman.
Isso não quer dizer, no entanto, que os tumores não fazem mal nenhum. “Não é possível chamar qualquer tumor cerebral de benigno. Mesmo que não tenha o comportamento de um câncer, qualquer massa que se expande no cérebro vai causar danos”, explica o cientista.
A triste descoberta mostra um limite para as pesquisas com células-tronco embrionárias, segundo Goldman. Agora, sua equipe está procurando maneiras de identificar as células-tronco que podem se tornar tumores e retirá-las antes do transplante. “Estou bastante confiante. Acredito que conseguiremos fazer isso em no máximo um ano ou um ano e meio”.
Se isso ocorrer, ele acredita que há uma grande esperança de resultados positivos em seres humanos no futuro. “Um futuro ainda um pouco distante. Há muito o que ser feito. Mas há esperança”, afirma.
Para o geneticista Alysson Muotri (que assina a coluna Espiral, no G1), o trabalho de Goldman é "muito bom". "É bem realista, principalmente numa área em que poucos pesquisadores mostram resultados imparciais e que vão fundo nas observações básicas obtidas experimentalmente", diz.
“É uma lição de casa para cientistas. Temos que entender melhor como diferenciar as células-tronco nos subtipos de neurônios desejados, eliminando células que ainda apresentam marcadores para ciclo celular”, afirma Muotri.
Os resultados da equipe foram publicados na revista "Nature Medicine".
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