quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Drauzio Varella entrevista Mayana Zatz

Dra. Mayana Zatz é professora titular de Genética Humana e Médica do Departamento de Biologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, coordenadora do Centro de Estudos do genoma Humano –IB –USP, presidente da Associação Brasileira de Distrofia Muscular e membro da Academia Brasileira de Ciências.

Pacientes beneficiados

Drauzio – Na sua opinião, nessa fase inicial das pesquisas, quais serão os pacientes que mais se beneficiarão com o uso de células-tronco?
Mayana Zatz – Tenho muita esperança de que as células-tronco ajudem no tratamento das doenças neuromusculares e neurovegetativas, nas quais ocorre uma degeneração natural do músculo. Se pensarmos que elas estão no nosso organismo para reparar algum problema ou deficiência, é natural acharmos que possam dirigir-se ao músculo que passa por processo degenerativo e emite uma série de sinais para atraí-las a fim de que recuperem ou substituíam o tecido danificado.
Um caso descrito na literatura mostra que isso é possível e abre uma esperança enorme para o tratamento dessas doenças. Estudando o caso de um garoto de 16, 17 anos, portador de uma forma de doença neuromuscular intermediária entre a forma grave de Duchenne e outras mais leves, mas que ainda conseguia caminhar, os médicos descobriram que ele era portador de uma mutação genética característica da forma grave da distrofia de Duchenne, cujos pacientes deixam de andar por volta dos dez anos. Em busca de uma explicação, a única coisa diferente que acharam na história desse menino para justificar a evolução mais benigna da doença era ter recebido, aos dois anos, um transplante da medula óssea de seu pai porque tinha uma síndrome de imunodeficiência. A hipótese levantada, então, foi que algumas das células da medula paterna haviam-se alojado no músculo e produziram a proteína que estava faltando. Como o problema primário tinha aparecido na medula, a grande maioria alojou-se nesse órgão, mas sobraram algumas que se localizaram no músculo. A expectativa é que todas poderiam ter parado no músculo que estava degenerando, se o problema de medula não existisse.

Drauzio – O que você chama de doenças neuromusculares?
Mayana Zatz – São mais de 50 doenças. Existe um grupo chamado de distrofias musculares, que se caracteriza pela degeneração progressiva do tecido muscular, provocada por um defeito genético que resulta na falta de proteínas essenciais para o músculo. Nas formas graves da doença, as crianças param de andar aos dez, doze anos de idade. Nas formas que se manifestam na idade adulta, os pacientes começam a apresentar esse sintoma aos 30, 40, 50 anos.
Em algumas dessas doenças, a fraqueza muscular é o efeito secundário de uma alteração no neurônio motor. O problema não está no músculo que acaba degenerando porque o neurônio que deveria enervá-lo não o faz de maneira adequada.

Drauzio – Temos recebido uma quantidade enorme de perguntas a respeito da utilização de células-tronco em pacientes que ficaram paraplégicos ou tetraplégicos depois de um acidente. De que maneira esse problema poderia ser reparado com o uso de células-tronco?
Mayana Zatz – Acho que será possível refazer a medula que foi lesada num acidente. Agora, como isso vai ser feito ainda não temos idéia ainda. Minha impressão é que será mais difícil reparar as lesões mais antigas, porque já estão cicatrizadas. Talvez, uma possibilidade seja refazer a lesão para que atraia as células-tronco para formarem novos neurônios. O caminho a percorrer é longo, mas acredito nos resultados. No entanto, as pessoas precisam entender que as pesquisas não devem ser confundidas com possibilidade de tratamento.

Drauzio – Você insiste em que nem todas as doenças poderão ser tratadas com células-tronco. Alzheimer e mal de Parkinson incluem-se nessa categoria?
Mayana Zatz – Provavelmente, as células-tronco beneficiarão os portadores do mal de Parkinson, na medida em que possam substituir os neurônios que deixaram de fabricar dopamina.
O mesmo não acontece com Alzheimer, uma doença causada pelo depósito de placas amilóides entre os neurônios. Como elas interferem na circuitaria, os neurônios deixam de comunicar-se uns com os outros e atrofiam, dando lugar à perda cognitiva e aos outros sintomas da doença.
Não permitir que as placas se acumulem ou que se formem parece ser a solução para prevenir ou tratar a doença de Alzheimer. Trabalho publicado há pouco tempo com camundongos geneticamente criados para desenvolver uma forma de Alzheimer mostrou que é possível recuperar os neurônios, principalmente os mais jovens, ministrando anticorpos que impeçam a formação das placas ou ajudem a dissolvê-las.

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